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Distintivo Blue - Toca Autoral!


Um dos principais objetivos do Memória Musical do Sudoeste da Bahia [@memoriasudoeste], projeto de pesquisa, fomento e preservação independente, para além do simples acumular material sobre a música da nossa região, como qualquer museu, é incentivar os artistas através da produção original de conteúdo: pensar não apenas o passado, mas o hoje, o agora.

No subprojeto TOCA AUTORAL! não há espaço para tributo: queremos mostrar que, em nossa região, há muita gente criando e se expressando através da arte. Apresentaremos diversos artistas, de variados gêneros musicais, mostrando suas próprias obras, muitas vezes ainda inéditas, e disponibilizando gratuitamente em plataformas de streaming, em formatos diversos. 

Em novembro, chega a vez do anfitrião do subprojeto TOCA AUTORAL! mostrar um pouco do seu universo: o Distintivo Blue comemora seus 15 anos de estrada blueseira como o último participante desta temporada.

🏡 Nesta etapa, o cenário da parte musical é a Sala Angelina Timóteo de Oliveira, espaço de trabalho da Distintivo Blue. Já a parte das falas foi gravada no Estádio Municipal Lomanto Júnior. 

Música é arte. Arte é expressão. O que nossos artistas têm a dizer atualmente?


A PRODUÇÃO

A ideia do Toca Autoral! remonta a 2017, quando desenvolvemos uma experiência semelhante, no então interditado teatro do Centro de Cultura Camillo de Jesus Lima, fechado para eventos com a presença de público, mas utilizado pelo Distintivo Blue como local de ensaio e gravações desde 2015. Utilizando a mesma pauta (duas manhãs por semana), convocamos artistas locais para gravar vídeos no formato voz-e-violão, executando cinco músicas, sendo que destas, três deveriam ser autorais. O @memoriasudoeste ainda não existia: tudo foi realizado sob o seu projeto ancestral, a BLUEZinada! [confira aqui uma playlist com esses vídeos antigos], mais direcionado ao blues e jazz, portanto, as CCCJL Sessions extrapolavam sua temática e anunciavam a necessidade de um trabalho voltado à musicalidade da região sudoeste da Bahia, que só nasceria em 2019.

Desta vez, pensando na enorme popularização dos chamados "shows-tributo", onde a nostalgia pelos chamados "clássicos" termina por, não raro, desestimular a execução da música autoral nos diversos palcos da região, decidimos radicalizar a antiga proposta, convidando apenas artistas que não se limitam unicamente a reproduzir o que já foi consagrado, mas também criam arte nova, provando que a música contemporânea ainda existe e continua expressando seu tempo e espaço, papel de todas as artes desde tempos remotos. Desta vez são seis músicas, todas autorais, além de pequenas falas explicativas e uma autobiográfica de até cerca de dez minutos. O formato ainda é minimalista, geralmente voz + instrumento, dada a nossa limitação em equipamentos, pessoal e tempo para a produção dos materiais.

O título do subprojeto é uma clara provocação ao universo dos "shows-tributo": ao invés do famoso, exaustivo e, muitas vezes, automático "toca Raul!", incentivamos o artista a mostrar suas próprias criações. O "Toca Autoral!" surge, pela primeira vez, no texto da matéria de capa da primeira edição da nossa zine, Memória Musical do Sudoeste da Bahia [Acesse aqui], nos inspirando a aprofundar o conceito que se materializa agora. Afinal, se o próprio Raul Seixas tivesse cedido e estacionado no confortável "tributo a Elvis" que marcou o início de sua carreira, não investindo em sua própria identidade artística, quem gritaria "toca Raul!" hoje?


O CONTEÚDO

O Toca Autoral! não se limita à produção de vídeos: o artista tem acesso a um sistema completo de produção original, que inclui a publicação de vídeos individuais de cada uma das faixas, além do vídeo completo, incluindo as falas explicativas e autobiográfica. Ainda, a uma sessão de fotos, que poderão ser utilizadas para a sua própria divulgação, como desejar. As músicas são mixadas e masterizadas para compor um EP de verdade e distribuído para as principais plataformas de música, como Spotify, Deezer, Apple Music, Amazon, etc. A gravação ainda será lançada no formato podcast e disponibilizada nos principais agregadores. Ao final da temporada, será lançada, ainda, uma edição especial da nossa zine, que será publicada tanto em formato digital (.pdf) quanto impresso e em áudio, enriquecendo o portfólio do artista e, mais amplamente, a musicalidade da região em geral, valorizando a produção autoral e incentivando outros artistas a tocar suas próprias músicas.

Todo esse material é entregue ao artista, gratuitamente, para que o utilize como julgar adequado para o desenvolvimento de sua própria carreira artística. Assim, durante o período de lançamentos, ainda  buscamos formas de acesso aos veículos de Imprensa, como emissoras de rádio, TV, jornais, revistas, blogs, etc., sempre com a preocupação de registrar toda e qualquer participação nesse sentido e publicar em seguida.

Ao artista é exigido, para a participação, certo nível de comprometimento: ensaiar suficientemente suas músicas para uma boa execução, ser pontual às participações e fornecer as letras cifradas de todas as canções, afinal, o "'Toca' Autoral!" também significa incentivar e permitir que o público conheça sua obra a ponto de também desejar/conseguir executá-la, de onde estiver. Trata-se de um projeto de fomento ao artista, mas, também, de formação de público. Demonstrar que o artista regional guarda, em si, tanto valor quanto o "consagrado" e divulgado em grandes proporções é uma das máximas mais caras do @memoriasudoeste

Foto: Plácido Oliveira

Distintivo Blue, por ele mesmo

Plácido Oliveira: "O Distintivo Blue começou em 2009, que foi o momento em que eu estava afastado dos palcos enquanto artista. Desde 2000, mais ou menos, eu participava de bandas na cena rock de Conquista, e ali por volta de 2005, a cena deu uma queda, as bandas começaram a acabar um a uma. Eu fiz parte de várias bandas, mas as que se destacaram mais foram a Tomarock, que era rock anos 70, essencialmente cover, a primeira banda com quem eu subi num palco, na concha do Centro de Cultura; logo em seguida eu fui para uma banda chamada The New Old Jam, que era no mesmo estilo, cover de Led Zeppelin, Deep Purple, Pink Floyd, como se faz muito hoje em dia. Ela estava começando a criar suas próprias músicas, então foi dela que veio, por exemplo, De Cara no Blues, música de Thomaz Oliveira, hoje da Café com Blues, e em 2005, 2006, ali, a banda acabou, várias bandas acabaram, na verdade, então participei de alguns projetos esporádicos, mas eu parei de pensar na música como uma constante, na verdade nessa época eu não pensava muito em música como uma profissão.

No final de 2008 eu me tornei sócio fundador de um espaço cultural que foi bem importante na cidade, chamado Viela Sebo-Café, inaugurado em 2009. Em todo o ano de 2009 eu fiquei no Viela ali nos bastidores, negociando com maioria dos artistas para tocar, mas ao mesmo tempo eu percebi que não era muito a minha, eu sentia vontade de estar no palco, eu via muito dos meus colegas ali no palco, meus amigos no palco, e eu falava "acho que meu lugar não é aqui atrás do balcão, preparando cappuccino. Meu lugar é no palco". Na verdade essa foi minha primeira "crise de abstinência de músico". Quem é músico sabe do que quero dizer: muitas vezes a gente tenta se distanciar da música e não consegue, não se sente feliz, não se sente completo, e essa acho que foi a primeira vez que eu tive isso, assim, de forma palpável. 

Então, ali no meio de 2009 eu chamei dois dos meus ex-companheiros da TNOJ, dois guitarristas, e falei "vamos montar uma banda de blues". Até então eu nunca tinha tido uma banda de blues, só de rock, e a intenção era simplesmente retornar aos palcos, não tinha muito esse pensamento de criar a música própria, nem nada, era fazer o que todo mundo, a maioria das bandas de blues faz: tocar os clássicos, se divertir, e aí foi assim que nasceu a Distintivo Blue, numa conversa de MSN na época, a Distintivo Blue fez seu primeiro show no próprio Viela em 22 de janeiro de 2010. Eu já tinha saído do Viela, no último dia de 2009, vendi minha parte da sociedade, e a Distintivo começou como uma proposta de banda mesmo, de coletivo, aquela ideia bem democrática, tipo Titãs, aquele monte de gente, todo mundo com voz igual, um por todos, todos por um, e ela trocou de músicos várias e várias vezes.

Em 2012 mais ou menos, depois de já muita gente ter passado pela banda, a gente teve um certo episódio de desengano com o mundo da música no âmbito local, e decidimos acabar com a banda. "Vamos fazer esse show aí, depois acabou e cada um vai fazer o que for". Passei 2012 até o final de 2013 praticamente sem escutar música. Eu ficava só ouvindo audioaulas para concurso público, até que um dia a gente fomos em um espaço chamado Casa do Rock, bem underground, e aí a gente se reuniu lá, eu e os meus ex-companheiros de banda e Nem (da banda Cama de Jornal, um dos proprietários) falou: 'Por que vocês não fazem um show aqui?' A gente topou, só para matar saudade mesmo, e fizemos um show na Casa do Rock no finalzinho de 2013, acústico mesmo, eu tocando cajón e cantando, que foi uma coisa que eu desenvolvi com o tempo, por falta de baterista, cantar e tocar cajón ao mesmo tempo. Fizemos esse show, nos empolgamos e resolvemos voltar com a banda. Chamamos de volta o baterista Weslei Lima, e a gente começou uma temporada muito produtiva para o Distintivo Blue, o período de 2014 até 2016, acho que foi o mais intenso para o Distintivo Blue. Foi quando fiz vários cursos de music business e a gente tentou fazer da banda um meio de vida mesmo, como uma empresa, CNPJ, tentando fazer produtos da banda, desde 2011 já tinha o BLUEZinada!, que era uma zine especializada em blues, mas que também tinha o objetivo de aproximar o público do universo da banda. Tinha a zine impressa, que era distribuída nos shows, e a zine virtual, em PDF, e o portal, depois virou o podcast, o primeiro podcast de Vitória da Conquista. 'O podcast sobre Blues e afins da Distintivo Blue', então tinha um complexo de coisas envolvendo a Distintivo Blue, sempre com muita interação com o restante do cenário Blues do Brasil.

Voltando um pouco, em 2010, o primeiro lançamento que a gente teve de Fonograma não foi nem um CD nosso, mas uma participação numa coletânea de Blues Nacional chamada Máfia da Mortadela, que foi organizada pelo Roberto Terremoto, de São Paulo, e saiu a faixa Luar do Pontal, que a gente só tinha ela gravada até então. Na verdade, gravou mais incentivado por essa coletânea mesmo, talvez se não tivesse isso a gente demoraria para gravar. Então, a gente tinha Luar do Pontal, única representante de fora do eixo Rio-São Paulo nessa coletânea, depois teve um volume 2, e a gente foi a única representante do Nordeste, dessa vez com Na Trilha do Blues, que a gente lançou em 2012. Em 2016, 2015 por aí, o Brasil começou a sofrer uma crise econômica muito forte. Os bares começaram a fechar, os espaços para tocar começaram a ficar mais restritos, e novamente muitas bandas começaram a acabar. No Distintivo Blue, membro a membro foi saindo , o pessoal foi vendo que não era muito sustentável apesar das estratégias que a gente tinha de tentar fazer a música como uma profissão.

Em 2016 a gente tinha uma rotina bem pesada na verdade. Acho que isso também colaborou para que os meninos decidissem sair. A gente ensaiava de 8 a 12 horas por semana, então era muito rígido e um negócio até meio pesado mesmo, e com estudos de music business, a gente ia montar até uma serigrafia e tudo, e aí todo mundo resolveu sair, e eu fiquei com o Distintivo Blue sozinho. Até esse momento eu ainda pensava no Distintivo Blue como um coletivo , e ficava naquela de tentar fazer acontecer, percebendo que os outros não acompanhavam, não estavam com o mesmo gás e isso sempre me deixava frustrado. Só na pandemia mesmo que eu tive aquele estalo de que eu não tenho que pensar como um coletivo, porque nunca foi, na verdade. A partir da pandemia passei a admitir o Distintivo Blue como o meu projeto artístico pessoal, só que ao invés de usar Plácido Oliveira, meu nome pessoal, eu prefiro usar o Distintivo Blue. Acho mais interessante.

Em 2016 todo mundo saiu, e em 2018, e aí a banda ficou realmente inativa, o podcast acabou, eu fui fazer outras coisas, e em 2018, 2019, a gente entrou em estúdio de novo pra gravar só duas músicas: Bucking Blues e NJJJ, e foi nesse momento que eu também percebi que em toda a discografia do Distintivo Blue eu tive problemas para conseguir expressar o que eu queria nas músicas. Gravamos em vários estúdios muito bons daqui de Conquista, mas mesmo assim nunca saía do jeito certo, faltava alguma coisa, então decidi começar a gravar em casa mesmo. Não tenho conhecimento de engenharia musical nem nada, mas tenho ouvido de músico, então eu fui tentando fazer umas coisas, e veio a pandemia, todo mundo começou a gravar coisas em casa, e aí pensei: 'agora é a oportunidade'. Gravei uma versão de Na Trilha do Blues em que eu tocava todos os instrumentos, e nessa época eu tinha pensado que o Distintivo Blue tinha acabado, que não ia dar certo, e usei o nome Joe Malfs Clan. Lancei Na Trilha do Blues, eu toquei todos os instrumentos, cajón, violão, dois violões, guitarra, voz principal, vários backing vocals, gaita e tal, para testar mesmo, uma coisa bem experimental, e o resultado eu gostei. Talvez em termos de frequências e questões técnicas seja inferior às demais, mas eu acho que ficou mais próximo do feeling que eu queria do que quando gravei em estúdios pagos , vamos dizer assim, com profissionais, então eu decidi a partir de então fazer sempre assim.

Depois eu gravei O Andarilho, faixa de minha autoria, e fiz a mesma coisa: gravei todos os instrumentos, usando o que tinha disponível e o videoclipe também eu fiz todo sozinho, na pandemia, enclausurado, e assim vai ser o Distintivo Blue daqui pra frente: eu prefiro perder em qualidade técnica, mas ganhar em feeling, em expressividade artística, até porque fazer Blues na Bahia é o underground do underground, porque o mainstream geralmente não conhece o Blues, e geralmente o pessoal da cena rock também não, então o Blues é mais underground do que o punk dentro do underground. Pouca gente conhece, e daí a dificuldade em encontrar músicos. Eu não posso botar um baterista de punk pra tocar Blues, porque o feeling é outro, assim como eu também não me atreveria a tocar forró, axé, porque não escuto isso, então eu não teria a pegada certa. Todo músico sabe do que estou falando. Você deve ter a bagagem naquele gênero que você tenta fazer. 

Então, eu diria que o Distintivo Blue é uma coisa bem artesanal, conceitual, e até antimercadológica, porque eu parei de tentar correr atrás dos padrões da indústria, daquela gravação impecável, para fazer a sincronização e colocar em trilha sonora de comerciais. Parei de perseguir esse tipo de coisa, porque eu entendi que o Blues é underground, dificilmente vai chegar a ser algo de massa, como eu sonhava antigamente. Então, tudo o que vier do Distintivo Blue vai ser sempre experimental, despretensioso e descompromissado com padrões da indústria musical. Se o padrão de hoje é uma música em que nos primeiros 15 segundos você já está quase indo para o refrão e já deu a sua mensagem, não tenho interesse nisso. Se artisticamente a música pedir isso, eu faço, mas eu não vou fazer isso em busca de engajamento. A música é arte. Eu não faço meros produtos. Primeiro a arte, depois penso em como torná-la um produto. 

E é isso: o Distintivo Blue é o meu principal projeto artístico autoral. Toda vez que você vê por aí show do Distintivo Blue, pode ter certeza que mais da metade do repertório vai ser de músicas autorais, outra parte vai ser de versões de artistas conterrâneos, também para prestigiar e valorizar essa questão da música independente, desde sempre o BLUEZinada!, que foi o embrião do Memória Musical do Sudoeste da Bahia, teve essa preocupação em valorizar o que não cai do céu pela grande mídia. E esse é o Distintivo Blue: 'o Blues autoral do sudoeste da Bahia', desde 2009. É algo que eu faço com muito prazer, e com muita necessidade mesmo: todo artista tem a necessidade de se expressar, e por isso o Distintivo Blue não tem previsão de acabar, porque enquanto eu estiver vivo terei vontade de me expressar artisticamente. Eu sempre pensei artisticamente. Na minha infância e adolescência eu pensava artisticamente do ponto de vista voltado para as histórias em quadrinhos, já que fui roteirista de histórias em quadrinhos, e quando eu conheci a música pensando nos bastidores eu 'troquei' de arte, digamos assim. Sempre pensei artisticamente. Quem me conhece mais próximo sabe que sempre foi assim. 

O Distintivo Blue tá aí desde 2009, teve algumas pausas enquanto ainda não se entendia enquanto conceito, mas agora, ainda que não esteja tocando sempre por aí, é uma banda, um projeto que tá sempre ativo, nunca aconteceu, desde que o Distintivo Blue nasceu, um dia sequer que eu acordasse e não pensasse em alguma coisa, alguma boa ideia para o Distintivo Blue. Eu respiro isso, respiro música do ponto de vista do fazedor de música todo santo dia, todo segundo, e isso foi o que eu entendi nas tentativas de sair da música. Sempre falo que não consigo ter uma relação com a música de meramente consumidor: eu sempre vou pensar do ponto de vista dos bastidores, então onde eu tiver o Distintivo Blue vai estar e quando eu não tiver mais aqui o Distintivo Blue ainda vai estar. Para isso que existem as gravações."


Confira o Episódio completo abaixo:


🟠 Playlist completa no Youtube [episódios completos]

🟢 Playlist completa no Youtube [músicas separadas]


MÚSICAS

BLUES DO COVARDE
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400047

"Blues do Covarde é a primeira faixa do primeiro EP do Distintivo Blue, lançado em 2011. A música nasceu enquanto eu cursava a faculdade de História. Sou historiador, formado pela UESB, e lembro de uma aula de História Medieval em que a professora Rita falava sobre os cavaleiros medievais. Foi aí que tive a ideia da frase "eu sou o cavaleiro que não sabe duelar". Naquele contexto, um cavaleiro que não sabe duelar é um inútil, pois a essência do cavaleiro, aquele nobre e importante personagem, era justamente a capacidade de guerrear. Assim, nasceu o conceito do covarde, o 'cavaleiro farsante'.

Mais tarde, com uma melodia de blues em mente, desenvolvi o restante da música. Gravei uma demo e chamei Rômulo Fonseca para trabalhar na harmonia. Gravamos um vídeo-guia para a banda, e assim foi com várias outras canções: eu criava uma versão voz e violão e enviava ao grupo, que incrementava com acordes mais ricos que os meus. O conceito central da música é a hipocrisia humana. A letra aborda como as pessoas têm dificuldade em reconhecer seus próprios erros, sempre atribuindo a culpa ao outro. É uma reflexão sobre a natureza humana e um convite à autorreflexão: 'será que sou tão bom quanto penso que sou?'.

Essa ideia permeou até o tema do meu TCC em Direito, explorando como a filosofia, a religião e o Direito criam argumentos para justificar nossas ações. No fundo, a história da humanidade é a história da opressão e a exploração do mais fraco, a velha 'lei do mais forte', floreada e camuflada por inúmeros conceitos filosóficos, religiosos, morais e jurídicos. O Blues do Covarde convida a encarar essa realidade e refletir um pouco sobre isso."

Vou contar a minha história
Pra ver você chorar
Me chamam de covarde
Mas vou me justificar
É que eu não posso
Eu não consigo
Sair desse caminho tão errado,
Me livrar desse conflito

Sou tão fraco, imagine
Que detesto a fraqueza
Por isso eu não resisto:
Piso em quem é indefeso
Então eu canto meu blues
Pra me justificar
Eu sei que ser assim é complicado
Mas nunca tentei mudar

Na batalha que é a minha vida
Só pra metaforizar
Eu sou o cavaleiro que não sabe duelar
Por isso eu canto este blues
Pra me justificar
Eu sei que ser assim é complicado
Mas não consigo mudar

Sim, a estrada é muito longa
E eu não quero me cansar
Então subo nas costas
Daquele que pode andar
Enquanto canto meu blues
Que é pra me inocentar
Não ligo se só convenço a mim mesmo
O importante é ganhar

Essa então é a minha história
Foi difícil de contar
É que eu nunca penso nisso
Mas o problema está lá
Então eu canto meu blues
Pra me justificar
A poeira está debaixo do tapete
E é melhor que fique lá

Mas o que eu quero
Tudo o que eu quero
É chegar lá


O ANDARILHO
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400048

"O Andarilho surgiu a partir de uma sequência de acordes que criei no início das gravações em estúdio. Lembro de estar no estúdio de Diego Oliveira para gravar Luar do Pontal, em 2010, e ficar dedilhando esses acordes no violão. A melodia permaneceu na minha mente, mas a letra só veio por volta de 2016. A inspiração veio da situação dos animais abandonados, ignorados nas ruas. Esses seres, sem direitos, sofrem em silêncio na 'cidade dos homens'.

A música traça um paralelo com a hipocrisia humana abordada em Blues do Covarde: o mais fraco é sempre invisível. O Andarilho é uma metáfora para os animais de rua, mas também pode representar qualquer pessoa abandonada ou marginalizada. A letra foi inicialmente pensada para os animais, mas sua mensagem é dinâmica, podendo se aplicar a outros contextos, de acordo com quem escuta."

Noite escura
Vento e chuva
A rua sem ninguém

Não devia estar só
Mas podia ser pior
Esperar quem não vem

Todo um mundo girando
Falando, sorrindo, cantando
E ele sempre só

Já cansou de chorar
E é difícil sorrir
Desistiu de amar
É mais fácil fugir

Madrugada
Alvorada
Até o pôr-do-sol

Não devia estar só
Mas é até melhor
Depois do que passou

Todos passam olhando
Censurando ou ignorando
Mas sente, como nós

Não adianta chorar
Ninguém vai acudir
Não merece um olhar
Nem devia existir

Não tem alma
Nem vale nada
Consigo apenas dor

Não devia estar só
O mundo é bem melhor
Pra todos nasce o sol

Uma mão se estendendo
Um abraço apertado
Um sonho, ou algo assim

Eu te ouvi chorar
Então vim até aqui
Chega deste lugar
A dor chegou ao fim


DETETIVE BLUE
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400049

"Detetive Blue é uma brincadeira com os erros comuns no nome da banda Distintivo Blue. Desde sempre, as pessoas confundiam, chamando de "Distintivo Blues", "Dispositivo Blues", "Instinto Blues", entre outros. Um dia, alguém mencionou "Detetive Blue", e a ideia ficou na minha mente, porque achei bem engraçado. Transformei isso em uma música com tom humorístico, imaginando um herói de quadrinhos, inspirado em figuras como Chapolin Colorado, as histórias de Léo Canhoto & Robertinho, algumas de super-heróis, etc.. A música traz a história de um anti-herói em uma cidade tomada pelo crime, com influências de filmes dos anos 80 e histórias de faroeste. Um resquício da minha bagagem do universo das HQs. Acho que ficou bem legal. Gostei bastante do resultado."

No calor da madrugada
Na frieza do dia
O crime acontecendo
Crueldade, covardia
A cidade está entregue
Nos salvar quem poderia?
O medo está rondando
Tudo o que vejo é judiaria

Como um câncer, os bandidos
Se apossaram do lugar
Consideram inimigo
Quem seu caminho cruzar
Dominaram a polícia
Que poder espetacular!
Oh, céus! Quem, neste mundo
Poderá nos ajudar?

Uma figura estranha
De quem nunca ouvi falar
Chegou à cidade
Que chamávamos de lar
Dizem ser um justiceiro
Um andarilho impopular
Nele há algo diferente
Pôs alguns malfeitores a chorar

De terno e gravata
E seu sobretudo
Chapéu na cabeça
Óculos escuros
Seu nome é Justiça
De norte a sul
Cuidado, bandidos:
É o Detetive Blue

Pode até ser um vampiro
Uma bruxa num covil
Algum assassino
Ladrão de vinil
Com ele por perto
Não resta nenhum
Cuidado, bandidos!
Detetive Blue

Seu método estranho
De agir lhe trouxe fama
Um cartão de visita
Onde outrora havia drama
Área liberada
Perigo algum
No cartão, somente escrito:
“Detetive Blue”

Os bandidos, um a um
Desapareceram ou fugiram
Alguns deles, corajosos
Encararam o perigo
Sendo logo eliminados
Pelo herói desconhecido
Cuidado, Bandidos:
Detetive Blue

Nosso lar está de volta
Como fora há muito tempo
Já podemos ir lá fora
Sem ter medo, sem tormento
As crianças brincando
Sob o sol, sentindo o vento
E os adultos comemoram celebrando
O céu azul, não mais cinzento

E seguindo pela estrada
Sempre à noite, pelas sombras
A caminho de uma cidade
Que ainda arda em chamas
Para agir novamente
Como seu instinto induz
Caçador de bandidos
Detetive Blue

DOZE HORAS
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400050

"Doze Horas foi composta entre 2013 e 2014, inspirada na minha esposa, Naiane. Na época, ela morava em outra cidade, Belo Campo, e nossas longas conversas pelo Messenger do Facebook foram a base da composição. Uma noite, conversamos por 12 horas seguidas, de seis da tarde até seis da manhã, e essa experiência inspirou a frase: "O que eu preciso é de mais 12 horas contigo".

A música foi lançada em 2015 no álbum Todos os Dias, Volume 1, mas já havia aparecido em 2014 no álbum Orgânico, em versão acústica. Desde então, ela é uma homenagem constante à pessoa que divide sua vida comigo, que esteve presente em momentos marcantes da minha vida, desde o show de retorno na Casa do Rock, onde ela estava na primeira mesa em frente ao palco (na mesa ao lado estava meu futuro baterista, Nephtali Bittencourt e Aline, sua esposa, e ninguém ainda se conhecia até então) até hoje."

Linda garota
Mostre quem você é
Olhe em meus olhos
Eu já posso lhe ver

Me dê a mão
Vem comigo
Esquece um pouco desse mundo
E vem correr perigo

Não tenha medo
Você não vai se machucar

O que eu preciso
É de mais doze horas contigo

Rock n’ roll
Feeling do blues
Eu, você e um belo lugar
Deixa, que o vento nos conduz
E sabe onde temos de chegar

O que eu preciso
É de mais doze horas contigo

Every day
Every night


AME A SOLIDÃO
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400051

"Ame a Solidão foi composta em 2014, num período difícil da minha vida. A música reflete sobre a diferença entre solitude e solidão. A solitude é valorizada como algo positivo, um momento de apreciação da própria companhia. Já a solidão, que é o tema da música, representa aqueles momentos em que nos sentimos sozinhos, mesmo desejando estar acompanhados.

A mensagem é clara: aceitar e lidar com a solidão é um processo de amadurecimento e fortalecimento. Apesar de vivermos em sociedade, há uma dimensão inevitável de solidão na experiência humana. Ame a Solidão busca transmitir que, embora os momentos difíceis sejam inevitáveis, a forma como reagimos a eles define como seguimos em frente."

Ame a solidão
Pois é a única que não te abandona
Tão certa quanto a morte
Sempre firme e forte
Pronta a te abraçar

Ame a solidão
Que a dor no coração sempre passa
Você precisa mesmo
É ver de um outro jeito
E aproveitar

Siga seu caminho
Nem sempre chorando, nem sempre sorrindo
Mas não pare
Nem olhe pra trás
Regredir, jamais!
O mundo é todo seu

Aliás, seja vem vindo ao mundo
Segundo a segundo
A vida é um show sem ensaio prévio
Não há como voltar
Se, de repente, errar
Aprenda e siga em frente

Então ame a solidão
Que junto da morte é a única certeza
E se ainda assim
Você não acredite em mim
O que mais posso dizer?

E se ainda assim
Você não acredite em mim
O que mais posso fazer?

A ONDA
(Plácido Oliveira)
BR7PI2400052

"A Onda nasceu como uma continuação da música 2012, Miopia, que retratava questões sociais e políticas de sua época. Com o passar dos anos, muitas pessoas pediam uma versão atualizada, mas a inspiração só veio em 2021, durante a pandemia. A nova letra aborda eventos marcantes, como o 'I Can't Breathe' de George Floyd e a crise de respiradores em Manaus, além de reflexões sobre polarização política e o comportamento humano durante crises. O título A Onda faz referência ao experimento A Terceira Onda, que demonstrou como a coletividade pode perder sua individualidade e senso crítico, repetindo os mesmos erros históricos. A música é um convite à reflexão sobre nossas atitudes, e novamente abordando a figura do 'outro': é preciso ter cuidado ao apontar apenas 'o outro' como fonte de defeitos porque, para todo o resto do mundo, 'o outro' somos nós."

E então
A bomba explodiu
No colo do mundo
pra mostrar que a estrutura ruiu

Perseguição
Aos seus ideais
Pra mim a liberdade
Pra você, se não diz "sim", tanto faz

Só querem falar
Mas nunca ouvir
O eleito inimigo
Nem deve existir
Todo pensamento
Passando num funil
E a sensatez então se cala
Como nunca existiu

Uma escolha
Pareceu tão banal
Satisfez a bolha, entreteve
E hoje se mostrou fatal

“I can’t breathe”:
Um grito em Manaus
Soa justo, já que
"uma copa do mundo não se faz com hospital”

Viver, trabalhar
Pra sobreviver
Sustentando o luxo
De quem não te vê
Chorar por quem ama
Num número vazio
Num saco fechado, numa vala
E sequer se despediu

"A Onda"
Também te engoliu
Seu ódio transbordando o cegou
e de pensar o impediu

Verdade
Não mora em você
Seu dedo aponta com a facilidade
Que antes já fez morrer

Palavras de ordem
Pré-fabricadas
E é apenas "o outro"
Que acompanha a manada
Obedeça à cartilha
Se encaixe no padrão
Nós somos os donos da verdade, da bondade e razão

Memória
Aqui nunca existiu
Repete-se a história se espantando
Com o que já se viu

Distorcer
Para arrebanhar
Se o fato não convence
O recriamos pra ter do que falar

Tanta hipocrisia,
Cinismo e tudo mais
Bem mais que miopia
É o que a cegueira faz
Pura vaidade e sede de poder
O Blues do Covarde escancarado para quem quiser ver

Esperança
Para confortar
Um passo semi-invisível
Na dança do manipular

Ilusão
O bem contra o mal
O discurso limita a visão
E esconde: tudo é igual

Tudo o que os move
É a sede de poder
E quem por eles mata e morre
É só uma peça pra mover
O que você berra
Não é novo ou especial
Seus ídolos possuem pés de barro
E você é o lamaçal

Nós somos os donos da verdade, da bondade e razão
Seus ídolos possuem pés de barro e você é o lamaçal
Seu mundo não passa de ilusão



Ouça agora o EP Toca Autoral! - Distintivo Blue em sua plataforma de música favorita.



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FICHA TÉCNICA

Memória Musical do Sudoeste da Bahia apresenta: Toca Autoral! - II Temporada
Produção: Plácido Oliveira [http://linktr.ee/placidoliveira]
Agradecimentos: Naiane Nunes; Vinícius Bitencourt.
Gravado entre 22 e 28 de outubro de 2024, na Sala Angelina Timóteo de Oliveira [Distintivo Blue] e no Estádio Municipal Lomanto Júnior.
Vitória da Conquista, Bahia, Brasil.
Publicação: 30 de novembro de 2024


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Podcast | Memória Musical do Sudoeste da Bahia [zine] Edição Especial |


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Memória Musical do Sudoeste da Bahia

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