Musipédia Sudoeste

Artigos

Entrevistas

Discografia

A NOITE DA VERGONHA – Misoginia e recusa sistemática de transparência no Conselho Municipal de Cultura de Vitória da Conquista

Em prol da luta pela democratização e difusão das informações e do acesso à cultura para todas as pessoas, a Biblioteca Comunitária Donaraça, através de sua coordenação, tem feito um grande esforço para acompanhar e ocupar os espaços mais variados de discussão e deliberação das políticas públicas, dentre eles, o Conselho Municipal de Cultura de Vitória da Conquista – Ba (CMC). É sobre esse acompanhamento como observadora espontânea que segue o relato, reflexões e proposições sobre os fatos ocorridos em 06 de maio de 2024 na plenária do CMC.

Registro da Noite da Vergonha

O que acabou de ocorrer hoje à noite na sessão plenária do CMC de Vitória da Conquista foi muito triste e nos trouxe profunda vergonha, reflexão e perplexidade. Aliás, tanto em relação à gestão atual como da anterior, é muito frustrante acompanhar um conselho que ainda não conseguiu cumprir seu papel de ser uma instância que contribua efetivamente para a implementação de políticas públicas da cultura na cidade. Essa situação parece cômoda, desejada e orquestrada por quem acredita que os foros de participação democrática sejam irrelevantes ou possam ser manipulados impunemente.

No início da reunião ordinária do dia 6 de maio do corrente ano, através da leitura da ata e de um depoimento, todas as pessoas presentes na sala tomaram conhecimento como se deu a votação de abril que deliberou pela negação da demanda da sociedade civil de se realizar reuniões ordinárias do Conselho de forma online e/ou híbridas. A realização de reuniões nessas modalidades é prática largamente utilizada em várias partes do país e do mundo, pelos mais diversos setores e segmentos públicos e privados. Se fosse aprovada, tal medida representaria um avanço, a possibilidade da participação e engajamento de forma mais democrática de pessoas que não conseguem se deslocar até o lugar físico das reuniões, por inúmeros motivos. Negar essa possibilidade de inclusão é validar e apoiar o esvaziamento do Conselho, além de impedir a ampliação de suas discussões e decisões, embotando o princípio da transparência, valor caro à democracia.

O nosso testemunho que ora sublinha a sensação de vergonha e indignação por ter presenciado, num Conselho de Cultura, os fatos aqui relatados, procura relacionar algumas questões graves com o intuito de que as pessoas em geral possam se inteirar dos acontecimentos e ser provocadas a buscar mais informações, a fim de ampliar o debate e as possibilidades de enfrentamento.

Dentre as inúmeras questões que poderiam ser citadas, destacamos inicialmente o que foi pontuado acima, a negação das reuniões online, proposta rejeitada pelos representantes da Secretaria da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer – SECTEL e pelo atual presidente do Conselho. Este último parece não assumir que está numa função estratégica como representante da sociedade civil. Entre outros argumentos registrados em ata, tomamos conhecimento de que em pleno 2024 (pasmem!), na decisão do Conselho prevaleceu o entendimento de que seria “muito difícil” produzir e gravar reuniões online, assim como a validação das votações. Definitivamente parece que Vitória da Conquista, a terceira maior cidade da Bahia não pode entrar na era da Internet, ao menos não naquilo que esta pode trazer de melhor, aproximar as pessoas e facilitar a livre circulação das informações. Os defensores de tal interpretação alegaram que o contato presencial seria “imprescindível”. Sobre esse último ponto, lembramos aqui que, paradoxalmente, apesar de terem sido eleitos em setembro de 2023, somente em abril de 2024 houve quórum mínimo de conselheiros para se aprovar alguma coisa, e mais, várias pessoas comentaram que, no dia 08 de abril, conselheiros que sequer acompanhavam as reuniões marcaram presença (em reunião extraordinária!), justamente para votar com a SECTEL. Nessa conjuntura a presença física parece ser um problema relativo. Por que tantos conselheiros não puderam comparecer nos outros dias? Que interesses eles representam? O absenteísmo dos conselheiros tem sido constante e demonstra a dificuldade de locomoção e/ou o descompromisso com tão importante função? Há que se avaliar com critério essa questão para enfrentá-la de forma ética.

Nos perguntamos, qual a função dos representantes do poder Executivo dentro de uma instância que, em tese, também fiscaliza o poder Executivo? Seus representantes abarcam 30% dos conselheiros. Se somarmos mais uma cadeira do Legislativo, na condição de “situação”, ou seja, “apoiador” do Executivo, é fácil constatar que o equilíbrio de forças parece bem desigual, totalizando a possibilidade de 40% das cadeiras, presença que, diga-se de passagem, majoritariamente masculina. Por si só, esse fato de representatividade, tanto de segmentos como de gênero, parece ser uma contradição da função essencial dos conselhos em uma sociedade tão plural como é a nossa. Além disso, as 5 cadeiras da Sociedade Civil, dividida em eixos temáticos muito genéricos e abrangentes, não dão conta de representar a rede complexa e diversa das linguagens culturais. Há muito que os fazedores de cultura solicitam reformas no regimento para resolver essa e outras questões. Reformas que avancem, modernizem e não engessam ainda mais o Conselho.

É muito preocupante que o Conselho de Cultura gravite em torno da SECTEL, e mais, ao invés de acompanhar e fiscalizar o poder público, lhe serve de forma aparentemente impotente. Esse fenômeno parece saltar aos olhos de quem acompanha as plenárias, chegando ao cúmulo de muitas pessoas, que vão pela primeira vez às reuniões como observadoras, deduzir, de forma equivocada, que o servidor público da SECTEL seja o presidente do Conselho, mesmo que não se assente na mesa diretora. Uma inversão da função do Conselho de Cultura e de qualquer conselho digno desse nome, que seria deliberar, acompanhar e fiscalizar o poder e as políticas públicas, ser um olhar de fora, que pode agregar valor por não estar comprometido com aqueles que executam os orçamentos e o planejamento estratégico do município. Será que essa prática está presente nos outros conselhos de Conquista? Caberia uma reflexão geral sobre os papéis dos conselhos na cidade, e talvez a instalação de ouvidorias próprias e reorganização do desenho das cadeiras que representam cada segmento ou eixo temático. A nosso ver essa é a questão central a ser resolvida, o caráter e a composição do conselho, todos os outros esforços para avançar sofrem com a atual configuração. No entanto, parece que ainda não temos clareza desse ponto, ou o que é mais dramático, a atual configuração seria um obstáculo para aprovação de uma alteração tão radical e necessária, diríamos, vital. Futuras articulações da sociedade civil devem enfrentar esse dilema o quanto antes.

Em segundo lugar, no entanto, o mais grave e vexatório, aquele que nos motiva a escrever este texto, estão os fatos que se somam às denúncias da conselheira secretária e a sequência do que se seguiu ao seu pedido de desligamento do Conselho, alegando não conseguir mais conviver e atuar diante de inúmeros e constantes casos de misoginia e violência de gênero, que alegou ter sofrido e testemunhado em diversas ocasiões. Muitos de nós, que acompanhamos as plenárias, presenciamos inúmeras vezes a prática do interrompimento, sobretudo de mulheres, entre outras tantas atitudes, muitas vezes veladas e com verniz de polidez, que criam um clima extremamente tenso e não acolhedor em todas as reuniões do Conselho. Sem falar nas constantes menções implícitas e explícitas, de que a sociedade civil não deva se manifestar diretamente.

É difícil escrever sobre o assombro de ter testemunhado o que ocorreu na noite de 06 de maio, a noite da vergonha e a noite em que uma mulher da cultura ousou dizer: BASTA de MISOGINIA! Se isso, por si só, não fosse grave, o que potencializou a nossa dor e indignação foi o fato de que nenhum conselheiro presente tenha feito nenhuma fala em defesa da permanência da conselheira, como se a presença de uma mulher fosse descartável e indesejável, ratificando assim, ainda que simbolicamente, o silenciamento desta. Apesar do pedido de vista do conselheiro, representante da SECTEL, a ata poderia ter sido posta em discussão e não o foi, muito menos se cogitou a votação pela aprovação ou não do documento. O que se ouviu nos corredores nos deixou a sensação de que os demais conselheiros parecem estar constantemente acuados e desarticulados para enfrentar as manobras da SECTEL. A não discussão da ata, talvez seja o maior indício da recusa ao debate público e transparente. Seria a prova da veracidade do alegado pela conselheira?

Em que pese o compreensível choque e a surpresa inicial com a decisão da conselheira, esperava-se que alguma postura firme fosse tomada, no intuito de proteger a mesma, para além da frase “fomos pegos de surpresa” proferida pelo presidente. Com exceção de uma menção do vice-presidente sobre a decisão da secretária, a reunião seguiu normalmente. Sim, esse é o “normal”. Ignorar o contexto e fazer de conta que a pauta é seguida. Esse “normal” incluiu a tentativa de um dos conselheiros citados no relato da conselheira querer ocupar imediatamente a função que ela acabara de abdicar, devido às inúmeras violências de gênero que sofreu e denunciou. O conselheiro justificou sua “oferta” dizendo que o arranjo seria emergencial, até que uma possível votação fosse feita no futuro. Lembrou que tal ocupação ocorreu na antiga gestão “por falta de interesse da sociedade civil em ocupar a função”.

Não estamos aqui negando a necessidade de se dar sequência aos assuntos da pauta e a operacionalização das reuniões, e nem a competência das pessoas, e sim afirmando o necessário cuidado de se evitar o atropelamento e esvaziamento das pautas e a perda de sentido de se estar “reunido em Conselho”, que é deliberar, recomendar, tomar decisões ajuizadas e consensuais em prol do bem comum do, não se esquecendo jamais, que os conselhos devem dar voz e protagonismo à sociedade civil. Talvez a opção pela inação seja a opção mais característica das últimas gestões, o que é lamentável e pode explicar o quanto é estratégico se negar e/ou dificultar as transmissões em tempo real das plenárias..

Ignorar uma denúncia é condenar sumariamente a vítima. Após a saída da conselheira secretária, a manobra de ocupar imediatamente a secretaria, só não foi possível porque uma conselheira sinalizou que a vacância deveria ser resolvida a partir da manifestação do interesse dos outros conselheiros da sociedade civil e de votação em momento oportuno, uma vez que a secretária ainda não entregara a renúncia por escrito e poderia até mesmo reconsiderar. A partir daí, algumas vozes mencionaram o fato da necessidade da formalização do ato ou mesmo a possibilidade de reavaliação por parte da conselheira que abdicara. Mas, isso só se deu somente depois que as mulheres presentes na sala manifestaram ostensivamente seu constrangimento e preocupação com a inação, cobrando a apuração dos fatos. Ainda assim, apesar de algumas falas débeis serem murmuradas pelos homens presentes que possuíam o “direito a voz e voto”, nenhuma medida concreta foi proposta oficialmente e aprovada pelos conselheiros em relação ao apresentado pela conselheira, ainda que fosse a nível de encaminhamento devido ao inadmissível dos fatos expostos. Violência de gênero, misoginia e interrupção de falas pareceu não serem assuntos suficientemente urgentes e graves para o presidente, a quem caberia a mediação do conflito. Aqui cabe uma pergunta: o atual presidente do conselho é capaz e está comprometido em encarar de frente os principais problemas que dizem respeito à sua função?

Como já foi dito, este contexto de negação e violação de direitos se alimenta da deliberada e sistemática recusa da publicização das informações relacionadas ao Conselho e à necessária melhoria da comunicação da SECTEL com a sociedade civil.. É perceptível que desde muito tempo não se disponibiliza as atas das reuniões do Conselho em sites ou drivers oficiais, para que a sociedade civil possa se inteirar dos fatos e tirar suas próprias conclusões. Nem sequer existe um site autônomo do Conselho. O site oficial da prefeitura também não fornece informações completas sobre as questões da “cultura, esporte e lazer”. Esse vácuo de informações preocupa, ainda mais agora, que o inoperante perfil do Conselho no Instagram parece não estar funcionando, justamente no momento das consultas para formulação das políticas públicas relacionadas à PNAB. Em momento de pré-eleitoral as oitivas públicas carecem de acompanhamento ético e qualificado. Assim como, as escutas e a circulação de informações não podem ser feitas somente em função de editais e leis de fomento.

É muito constrangedor constatar que a terceira cidade mais populosa da Bahia não consiga adotar práticas mínimas de compartilhamento de informações e que o Conselho de Cultura não tenha nenhuma estrutura para funcionamento autônomo da SECTEL. Fato amplamente denunciado pela sociedade civil em vários espaços, através da entrega de documentos construídos coletivamente e de falas contundentes na Conferência Municipal de Cultura por diferentes agentes culturais.

É importante que se diga que o CMC não é um órgão da Secretaria de Cultura, e sim que é um órgão integrante do Sistema Municipal de Cultura e que só desempenhará suas funções constitucionais, se e somente se, finalmente, tiver de fato liberdade, autonomia, vontade política e recursos para, inclusive, decidir sobre como disponibilizará seus documentos. Somente o “como” é opcional. Destaco aqui a palavra “como”, pois a disponibilização de documentos públicos, como atas e gravação de reuniões (não resguardadas pelo sigilo em questões extremas de segurança) são instrumentos que devem e podem ser compartilhados, como prevê a Lei de Acesso à Informação (Lei N. 12.527/2011). Com pesar, constatamos também que a cidade fica refém das publicações da SECTEL, até a última gestão, a Secretaria de Cultura era a verdadeira “guardiã” dos documentos citados e outros mais, como as atas, que até agora não foram compartilhadas para acesso público de qualquer cidadão.

A encruzilhada circular em que nos colocamos passa pelo entendimento de que o aperfeiçoamento das instituições públicas oficiais da cultura passam necessariamente pelo Conselho e pela elaboração e efetivação do Plano Municipal de Cultura, que por sua vez também passa pelo Conselho de Cultura, que não consegue funcionar efetivamente, pelas questões citadas anteriormente, além de outros motivos mais complexos e estruturais. Como sairemos dessa encruzilhada? Que tipo de caminhos seremos capazes de construir e inventar coletivamente? Para onde queremos avançar?

Para instrumentalizar ainda mais o debate, citamos ainda mais alguns elementos que merecem nossa atenção dentro desse contexto: até o dia de hoje, não existe um relatório público do mapeamento dos fazedores de cultura e muito menos a formação de grupos permanentes por segmento para ouvir as demandas de cada eixo temático, não há instrumentos e canais formais para isso, além de um e-mail genérico que não une e nem articula os fazedores de cultura da cidade, além das falas esporádicas de que “é preciso constituir esses grupos”. Sem dados é impossível criar estratégias consistentes de enfrentamento das demandas da cultura e descentralizar recursos, assim como possibilitar a participação de amplos setores da sociedade, que sequer sabemos da existência, por não haver dados públicos produzidos pela SECTEL. A curto e médio prazo ficamos reféns das políticas de governo, ao sabor dos interesses ideológicos e partidários de ocasião, e não alcançamos uma política permanente de Estado, como seria definida no Plano Municipal de Cultura, se tivéssemos um. Nesse sentido, mais um apelo dos fazedores de cultura evaporou-se sem respostas satisfatórias nessa noite, a pergunta sobre o cronograma de pagamento da Lei Paulo Gustavo. Essa questão já foi apresentada até na Câmara Municipal e mais uma vez pontuada na noite da vergonha por mais de uma pessoa presente na plenária (A LPG é uma lei emergencial, por isso carece de celeridade em sua aplicação). A SECTEL informou apenas que “a qualquer momento os recursos deverão sair, que depende de outras secretarias”. Parece não haver um trabalho articulado e célere entre as pastas. Esperamos que essas dificuldades burocráticas sejam resolvidas na aplicação da PNAB. E que se avance para além das intenções. Outra prova da falta de prioridade das questões da Cultura, para além da realização de eventos pontuais, é o fato de que a Conferência Municipal de Cultura, sete meses depois de sua realização, ainda não publicou o relatório e nem deu nenhuma devolutiva à sociedade, tal ação seria uma responsabilidade da SECTEL (prevaricação?), enquanto a Conferência Nacional, organizada pelo MinC, que ocorreu em março do corrente ano, já iniciou suas devolutivas e disponibilizou documentos, deliberações e encaminhamentos em vários meios digitais. Entre nós, nem ao menos, houve respostas e encaminhamentos aos documentos apresentados publicamente à SECTEL e ao próprio Conselho em setembro/23. O que nos leva a pensar, que a Sociedade Civil também está sendo silenciada, assim como a voz das mulheres no conselho, misoginia, sexismo e falta de transparência. O que faremos com esses conceitos?. Entendemos que não ouvir e não levar em conta o que se diz é tão perverso quanto não deixar falar. Esse fenômeno redunda no esvaziamento do sentido das instâncias de participação política popular, uma vez que, até se permite que existam, mas são constantemente sabotadas, esvaziadas e inviabilizadas. Práticas da antessala do fascismo declarado.

Ouvimos as razões da conselheira e nos solidarizamos com ela. Se pudéssemos gostaríamos de lhe fazer um apelo, mas sabemos que não temos esse direito, o de que ela não abdicasse da cadeira do Conselho, uma vez que foi eleita democraticamente dentro de uma Conferência Municipal, para a qual, importantes setores da sociedade civil lutaram corajosamente, a fim de mobilizar as pessoas para a participação na eleição e nos debates que ocorreram em setembro, em detrimento da falta de informação que imperou naqueles dias e continua a prevalecer. Esse apelo estaria baseado, entre outras coisas, na consciência da importância representativa da conselheira e de sua atuação como agente social, ratificada em vários momentos por seus pares, quando a escolheram como delegada da Conferência Territorial do Sudoeste Baiano, da Conferência Estadual e, finalmente, também quando atuou honrosamente como delegada da Bahia na Conferência Nacional da Cultura, evento em que o audiovisual dos interiores teve papel relevante e de destaque.

Nosso desejo seria de que a conselheira pudesse voltar a ocupar a função de secretária, compondo a mesa diretora. Na impossibilidade, que ela pudesse continuar na função de conselheira, ainda que como suplente. No entanto, seja qual for a decisão dela sobre essa questão, manifestamos nossa solidariedade e apoio.

A resistência e enfrentamento das mulheres em funções públicas é a resistência de todas as mulheres, pessoas e instituições que militam pelos direitos culturais e pela equidade de gênero, que repetem a fala emblemática de Marielle Franco: “Eu não serei interrompida!”. Não ignoramos, no entanto, que recuar também é trazer outros companheiros e companheiras para andar juntos e juntas.

É importante que se registre que o desconforto da secretária não é apenas dela, ou uma questão de gênero, também é, mas não somente, uma vez que, em muitas ocasiões em que ocorreram as reuniões do Conselho, é possível sentir uma atmosfera pesada e não acolhedora. Homens e mulheres relatam esse desconforto e a experiência de também serem interrompidos e menosprezados, num jogo desigual de forças. Essa percepção também leva em conta os não ditos, os gestos, a postura do corpo, e mais recentemente, os fatos registrados de forma explícita na ata e em sua leitura e não discussão. Foi a esse estado de coisas que a conselheira denunciou, e não apenas a sua questão individual. Que não se perca de vista essa pontuação na análise dos acontecimentos da noite da vergonha. Sob pena de reduzirmos a gravidade do complexo contexto em que estamos paralisados e em eterna repetição.

Saindo do campo do desejo, temos plena consciência de que a presença segura e qualificada de mulheres (cis ou trans) em todos os espaços sociais, especialmente em posição de poder, só se efetivará quando formos capazes de sair da indignação teórica e de gênero e entender que o cerceamento da liberdade de uma mulher, é o cerceamento de todos e todas nós. Não é possível haver liberdade e pleno gozo dos direitos humanos fundamentais sem liberdade, respeito e informação.

Diante do exposto solicitamos, como membros da sociedade civil organizada, que a mesa diretora do Conselho Municipal de Cultura: 
  • apure e tome as medidas cabíveis, garantindo o direito de defesa e a apuração ética, transparente e consequente dos fatos;
  • caso sejam comprovadas as denúncias, que as pessoas envolvidas no delito sejam afastadas do Conselho;
  • encaminhe imediatamente relatório das denúncias aos órgãos competentes;
  • emita nota oficial do Conselho informando da apuração dos fatos e seus desdobramentos;
  • acione o Município para oferecer assistência à saúde mental da conselheira;
  • adote medidas urgentes para inibir práticas de violência de gênero dentro do Conselho;
  • adote medidas urgentes para tornar o Conselho de Cultura um lugar seguro e de acolhimento para a sociedade civil, garantindo-lhe a possibilidade de fala, escuta e devolutivas;
  • promova debates e regulamentação que prevejam equidade de gênero nas cadeiras dos três segmentos do Conselho (sociedade civil, representantes do legislativo e do executivo);
  • que nas discussões do novo regimento interno do Conselho se coloque em pauta o caráter e a função do Conselho, aumentando as cadeiras da sociedade civil, e idealmente, suprimindo a liderança do poder público, que hoje detém 50% das cadeiras (3 do Executivo e 2 do Legislativo);
  • coloquem em pauta, em caráter de urgência urgentíssima, a transmissão online e ao vivo das reuniões do Conselho, como um dos instrumentos para a democratização do acesso à informação e como uma das estratégias para coibir a violência de gênero e quaisquer outras práticas de exclusão;
  • crie grupos permanentes para articulação com os artistas e fazedores de cultura de cada linguagem artística, não se limitando às escutas da PNAB;
  • implemente medidas concretas para efetivar a autonomia do Conselho em relação à comunicação e a circulação de informações, abandonando a dependência da SECTEL;
  • apresente à SECTEL a demanda da sociedade civil pela melhoria dos canais de comunicação da secretaria para aperfeiçoar a interação e engajamento da sociedade de uma forma geral em torno dos direitos culturais e às manifestações artístico-culturais no município, exigindo um cronograma com metas claras para alcançar essa política de transparência;
  • solicite da SECTEL um cronograma de acompanhamento da aplicação/pagamento dos recursos da LPG e dos encaminhamentos da PNAB.
  • solicite da SECTEL a publicação do relatório e das devolutivas da Conferência de Cultura, estabelecendo um prazo que não ultrapasse o mês de maio.

É fundamental destacar que a Secretaria de Cultura tem papel dos mais relevantes na aplicação e desenho das políticas públicas no município e deve atuar dentro de suas prerrogativas, somando esforços com as outras instâncias do Sistema Municipal de Cultura, no entanto, ela precisa adotar práticas que contribuam para a promoção da autonomia e sustentabilidade dos outros órgãos do Sistema interdependentes do setor, favorecer e estimular a participação da sociedade civil, modernizar e democratizar seus canais de comunicação e interação, garantindo a equidade de oportunidades na aplicação dos recursos e nos processos decisórios. Entendemos também o papel estratégico do Conselho de Cultura e a organização da sociedade civil como produtora de discurso, desejos e possibilidades, expressão das demandas e interesses da sociedade civil, por isso, apostamos no diálogo e na necessidade de consensos possíveis dentro do que prevê a Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Que as reflexões e provocação desse extenso texto chamem a atenção para a complexidade do momento, e de que precisamos unir forças em torno da produção, fruição e reflexão da e para a cultura. Que os negacionismos e os fascismos não imperem em nosso meio. E que nenhum de nós consiga dormir tranquilamente sendo cúmplice da impunidade. Evoé!

Vitória da Conquista, 06 de maio de 2024, 23h57.

Biblioteca Comunitária Donaraça / Instituto Relicário

------------------------------
Publicado originalmente em 11/05/2024, em Foro Literário Sertão da Ressaca.

Por que publicamos conteúdo já publicado em outros sites?


------
Nota do Editor: o texto acima foi publicado neste site para fins de preservação histórica das movimentações artísticas, especificamente musicais, existentes em nossa região (Fase 2 do Projeto), não representando, em qualquer nível, a opinião/posicionamento do Memória Musical do Sudoeste da Bahia. O espaço, reiteramos, é disponibilizado a todos, desde que guardando relação com o nosso objeto de pesquisa - a musicalidade da região sudoeste da Bahia.

Memória Musical do Sudoeste da Bahia

O "Memória Musical do Sudoeste da Bahia" precisa da sua colaboração. Tem algum material guardado? Gostaria de publicar seu próprio texto aqui? Acrescentar ou retirar algo? Entre em contato através do "fale conosco". Vamos preservar juntos a nossa história!

Nenhum comentário:

Leave a Reply

Temas

@memoriasudoeste 1 1 em Pé 2 Alados 1973 1984 1986 1988 1990 1993 1994 1997 1999 2000 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023 2024 5C1 96 FM A Conquista do Rock A Tarde A Voz do Muro A-Divert Acervo de Cartazes Acrock Adão Albuquerque Afonso Ribas Afonso Silvestre Agosto de Rock Alan Kardek Alex Baducha Alisson Menezes Almiralva Ferraz Gomes Ana Barroso Ana Gabriela Ana Palmira Bittencourt Santos Casimiro Análises André Ará André Cairo Andréa Cleoni Antônio Carlos Fernandes Limongi Apache APAE Aquarius Blues Band Arlindo Polvinthai Arnaldo Antunes Arraiá da Conquista Artes plásticas Arthur Maia Artigos Assista! Autobox Axé Music Babá Ferreira Bad Boy Boogie's Balaio Band FM Banda de Música do 9º BPM Banda Firem banda Mixta Banda Sonora Bárbara Nascimento Batalha ChapaHalls Bazé Beatriz Bitch Band Benjamin Existe Betão Bete Pires Beth Soul Biblioteca Comunitária Donaraça Biblioteca Municipal José de Sá Nunes Blas Fêmia Bloco Algazarra Blog Blue Jam Blues BLUEZinada! BNB Boom!!! Boulevard Shopping Brasil FM Brasília Bráulio Ferraz Bregadeira Brumado Bruno Caires Bruno Lima Bruno Portella Cacau com Leite Caco Santana Café com Blues Café Society Caiik Caique Santos Cama de Jornal Câmara Municipal de Vitória da Conquista Camarote Beer Camerata Acadêmica do Sertão Camerata Carlos Jehovah Camillo de Jesus Lima Canta Bahia Canto do Sabiá Cantoria Cao Alves Captain Pepper Captain Peppers Carla Andrade Carlos Albuquerque Carlos Moreno Carlos Porto Carnaval Carol Ivo Carolina Medrado Casa do Rock Casa dos Carneiros Casa Fora do Eixo Casa Memorial Régis Pacheco Caso à Parte Cassiane CazAzul CCCJL CCCJL Sessions CDL Centro de Convenções Divaldo Franco Chamadas Abertas Charges e cartoons Chefinho Som Chico Luz Chirlei Dutra chorinho Christian Bernardis Cidadania Cinco Contra Um Cine Glória Cine Madrigal Cinema CIPA - RAP Circo de Cultura Ciro Brigham Cláudia Rizzo Clipping CMVC Colégio Sacramentinas Coletâneas e Discos Especiais Coletivo Escritores Conquistenses Coletivo Iron Horse Coletivo Suíça Bahiana Conferência Municipal de Cultura Conquista Metal Fest Conquista Moto Rock Conquista Rock Festival Conselho Municipal de Cultura Conservatório Municipal De Música De Vitória Da Conquista Consulta Pública Contos Coração de Jesus Corais Coral da UESB Crônicas Cultura curso de Cinema e Audiovisual da Uesb Cursos Dan Ribeiro Dani Lasalvia Daniel Drummond Danielle Rosa Dão Barros Davi Fernan De tudo na Band Depressivos Dércio Marques Destaques Deus e as Águas Deus Segue Nossa Guia Deus Seja Louvado Dia do Músico Evangélico Dia Mundial do Rock Diego Dell Carmo Diego Oliveira Diglett Joes Dinho Oliveira Dire Straits Legacy Dirlêi Bonfim Diro Oliveira Discografia Dissertações Distintivo Blue Divino Espírito Santo Djavan documentários Documentos históricos Dona Iracema Dorinho Chaves Dost Downloads DP Dragster Dreadful Trace Dreams Produções Dú Nosso Jeito DUDU Dumblegore Durval Lelys Ed Goma Ed Motta Edigar Mão Branca Edilson Dhio Editais Educadora FM Élder Oliveira Elomar Elton Becker Elton Dias Em memória Emilly Coelho Emissoras Entrevistas EP Erasmo Carlos Erudito Erudito: Orquestras e Bandas Marciais Escravos da Merenda Espaço Cultural A Estrada Espaços Ester Barreto Estúdio Drakkar Estúdio Drummond Eulá Evandro Correia Eventos Excalibur Rock Band Expoconquista Exposições F. A. Q. Fabio Sena Fabrício Gama Facebook Fainor Fainor Garage Band Famus Feira de Flores de Holambra Felisquié Fenix Rock Bar Fernando Bernardino Festa do Divino Festas Populares Festeccon Festivais Festival Avuador Festival da Juventude Festival de Inverno Bahia Festival de Música da Bahia Festival Educadora FM Festival Internacional de Violão Festival Nacional da Canção Festival Nossa Arte Festival Pra Cantar Junto Festival Rádio Rock Festival Suíça Bahiana Festival União Brasileira do Blues Festival Unimed do Sudoeste de Música Festival Universitário Intercampi de Cultura e Arte - FUICA FestUesb Filarmônicas Fita Amarela Fliconquista Fligê Flor de Tangerina Folk FomeStop forró Forró Temperado Fotos Freebird Gabriela Mello Gafieira Brasil Gal Costa Garboso Gean Ramos Pankararu Geórgia Nunes Geração Hit Geral Geraldo Azevedo Geslaney Brito Geslaney Brito e Iara Assessú Gil Barros Gil Brito Gil Ferraz Gilberto Gil Gilmar Cardoso Gilmar Dantas Gilmara Baby Gimba Jardim Giorlando Lima Glauber Rocha Glória Groove gospel Graco Lima Jr Grito Rock Grupo Barros Grupo Roama Guanambi Guigga Guilherme Arantes Guilherme Barbosa Guilherme Menezes Gutemba Haeckel França Heavy Metal Heleno Ribeiro Hemoba Herberson Sonkha Herzem Gusmão Hiaguinho Hinos história oral Homens de Cabaré Humberto Pinheiro I. Malförea Ian Kelmer Iara Assessu Ice Drink Imagem Casa Som Imagem do Mês In Mundos In The Rocks Inércia Ingrid de Castro Brito Inside Hatred Instituto Relicário Ipiaú Iracema Miller Isadora Oliveira Ítalo Silva Itapetinga J.C. D'Almeida Jackson Alcântara Jacqueline Jack Jaime Cobra JayVee Jean Cláudio Jeanna Lopes Jequié Jeremias Macário Jingles João Donato João Omar João Paulo Pereira Joe Malfs Clan Jorge Luis Melquisedeque José Américo Josilene Pires Matias Jota Menezes Jota Quest Judson Almeida Juliana Brito Julio Caldas Junior Damasceno Juraildes da Cruz Kako Santana Karina Costa Kelly Prado Kessller Ketia Prado La Pança Ladrões de Vinil Larissa Caldeira Larissa Luz Larissa Pereira Lei Paulo Gustavo Léo Lima Léo Santana Letras Letras & Prosa Liatris Lili Correia Live Solidária Lives Lívia Ellen Livros Locutores Lollapalooza Lomantão Loro Borges Lua Ife Lucas Arruda Lucas Gerbazi Lucas Índigo Lucas Lins Luciano PP Lúcio Ferraz Luiz Caldas Luiz Carlos Figueiredo Luiza Aldaz Luiza Portal MAC - Movimento Artístico e Cultural de Vitória da Conquista Máfia da Mortadela Magoo Malförea Mallu Magalhães Mandacaroots Manel Manno di Sousa Manual do Músico Marcelo Bonfá Marcelo Lopes March of Revenge Marcha do Orgulho LGBTQIAPN+ Marcha para Jesus Marcos Marinho Mari Fernandez Maria Bethânia Maria Elena Menezes Oliveira Mariana Kaoos Marisa Monte Marlua Marta Moreno Mary Ouro Massicas Massinha Mastruz com Leite Mauré Maurício Franco Mauricio Sena Maurício Sena Max Santoli Mazinho Mazinho Jardim Mega Rádio VCA Melhor Feijão do Mundo Memória do Rádio memórias Metal Mi do Carmo Miconquista Mictian MIDAS Miguel Côrtes Mina Mórficos Mosaico da Cena MPB MPBlues Muitos Carnavais Mulher no Samba Musaé Música Autoral Musicante Sudoeste Músicos e bandas Nagib Natal Conquista de Luz Natal da Cidade Natália Bueno Nathan Soares Nattan Náufrago Urbano Nelson Pereira Nunes Nem Tosco Todo Nem Tosco Todo e as Crianças Sem Futuro NEOJIBA Nephtali Bitencourt Neto Comander Nilton Junior No Canto do Choro No Palco Noah Kinrin Nós Vozes & Eles Notícias ÑRÜ Nuclearte O Piquete O Rebucetê OAB Oktober Rock Old Stove Onildo Barbosa Originais @memoriasudoeste Orion Music Company Orquestra Conquista Sinfônica Orquestra Escola Joias do Sertão Os Barcos OSBA Outra Conduta OutroEu p Pablo Fornasari Pablo Luz Palestras Pandemia Papalo Monteiro Paraki Parrázio Patagônia Paul & The Moondogs Paul Bergeron Paulo César de Araújo Paulo Gabiru Paulo Macedo Paulo Pires Pedro Sampaio Pesquisas Petrônio Joabe PH Pilot Wolf Pindaí Pinote Pipa Pipa Música Plácido Oliveira Playlists PMVC Poções Podcast do Moss do Som Podcasts PodeCrê PodMeContar Poesia Point do Rock Políticas Culturais Pop PPGMLS Praça Barão do Rio Branco Praça da Juventude Praça Tancredo neves Prêmio Suíça Bahiana de Música Princípio Ativo Priscila Correia de Sousa Carneiro Produtores Programa Positividade Programas de rádio Público Punk Rock QGRecords Quarentena Quarteto de Blues Quermesse de Santa Dulce Quintas de Maio Rádio Baixaria Rádio Câmara Rádio Clube Rádio FM 100 Rádio Shiga Rádio Up Rádio USP rádios Rafael Flores Raifran Raimundo Sodré Ramanaia Randômicos Rap Raquel Dantas Real Rock Fest Reason Reconquista Recrucifixion Rege de Anagé Reggae Regional Reis Reis do Crime Renato Russo Renegados Retilínea Revista Gambiarra Revista Marginal Ricardo Castro Ricardo Marques Rita De Cássia Oliveira Lima Alves Roberto Carlos Roberto Sant’Ana Robson Falcão Roça Sound Rock Rock Cordel Rock em Prol Rock Vertente Romário Ronaldo do Sax Ronny Voxx Rony Barbosa Rosana Guimarães Rubenildo Metal Salvador Samba Samba & Pagode São João Sarau Multiverso Sarau Somos Vozes SASB Schangay Selvagens à Procura de Lei Séries SESC Shau & Os Anéis de Saturno Shau Saturno Sheila Lima Shows Signista Simone da Silva Guerreiro Simple Jeans Singing Along Sintoma de Cultura Social Freak Som da Tribo Somos Nós Sorrow's Embrace SouJuvs Spit Clown Sr. Pokan e os Tangerinas SS-433 Stratozero Suffocation of Soul Supercílio Supremo Tales Dourado Tambores & Cordas Tamires Dias dos Santos Tarcísio Santos Tarde UESB Taro Tarsis Valentim Társis Valentim Teatro Carlos Jehovah Terno de Reis Santa Bakhita Terno de Santo Reis teses Teu Soares Textos científicos Textos e reportagens de época Thaís Dias de Almeida Thais Macedo Lopes The Dug Trio The JackHammers The New Old Jam The Outsiders Thiaguinho Thomaz Oliveira Tiamat e os Garotos Perdidos Titãs Toca Autoral! Tomarock Tombstone Tonico Almeida Top Love Tosco Todo TR MC Trabalhos acadêmicos Trepidantes Três do Crime Tres Puntos Três Reis Magos Trio da Huanna TV TV Sudoeste TV UESB TVE Bahia UESB UESB FM UESC UFBA UFPB Uma Terra Só UMC UNIMUS Vadinho Barreto VDC Hip Hop GT Festival Vídeo do Mês Videoclipes Viela Sebo-Café Vinew Vinícius da Costa Januário Vital Farias Vitória da Conquista VOceve Vozes do Beco Weldon França Weldon Silva. Weldon França Weslei Gusmão Piau Santana WN$ Xangai Xuxa Yasmin Luene Zé Baticabo Zine

Acervo de Entrevistas

#museudorockvca

Doe sangue!