Por Afonso Ribas e Karina Costa
Evento aconteceu nos dias 11 e 12 de setembro, no Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima. Atrasos na programação, falta de profundidade nos debates e ausência da prefeita Sheila Lemos foram alguns dos aspectos destacados por quem esteve presente no espaço.
Com a presença de representantes de diferentes setores culturais, a 5ª Conferência Municipal de Cultura de Vitória da Conquista aconteceu nos dias 11 e 12 de setembro, no Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima. A programação deveria ter sido finalizada às 11h30 da terça-feira, 12, mas as atividades se estenderam até o período vespertino. Além do atraso no cronograma, outras questões como a falta de profundidade nas discussões, a ausência dos poder Legislativo e da prefeita, e o esvaziamento do espaço foram observadas por quem participou do encontro.
A baixa participação dos trabalhadores e trabalhadoras da cultura na conferência era algo já esperado por muitos. Dias antes do evento, parte da categoria artística se mobilizou para solicitar a alteração das datas. Um abaixo-assinado com o pedido foi protocolado na Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel) no dia 1º deste mês. Para o grupo, a realização do encontro em dias úteis impossibilitaria uma presença mais efetiva da sociedade civil, devido às rotinas de trabalho e/ou estudo de artistas e agentes culturais locais.
Mesmo com a solicitação feita via Sectel, as datas não foram alteradas e, assim, muitas pessoas não puderam estar presentes na conferência, que este ano abordou a temática “Cultura e Democracia em Construção no Sertão da Ressaca”. “Não foram dias adequados porque sabemos que os artistas no nosso país precisam ter outras atribuições de labor para conseguir sobreviver. Muita gente cuja presença seria importante não pôde participar”, contou a artista visual, Rogéria Maciel.
De acordo com Daniel Leite Almeida, presidente da Associação do Setor Audiovisual do Sudoeste Baiano (SASB), o esvaziamento aconteceu principalmente na terça-feira, 12. “Para o primeiro dia, a sociedade civil ainda conseguiu mobilizar as pessoas para que a eleição do conselho [Conselho Municipal de Cultura] não fosse esvaziada, visto que aconteceria na segunda-feira. Mas ainda assim, nós tivemos setores inteiros que não conseguiram ir porque estavam todos trabalhando”, explicou.
Discussões apressadas e falta de dados
A sensação de vazio não foi percebida apenas na ausência de pessoas na sala de espetáculos do Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima. Para profissionais como Rogéria Maciel, que participou da conferência pela primeira vez, as discussões sobre sua área de atuação, as artes visuais, foram pouco profundas.
Juliana Brito, historiadora e integrante de coletivos literários de Vitória da Conquista, também sentiu a falta de dados e indicadores culturais que, em sua opinião, deveriam ter sido apresentados pela Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel) e pelo Conselho de Cultura, e poderiam ser utilizados para um mapeamento da atual situação do setor no município.
“Eles não falaram, nós não falamos e nós não nos escutamos, para além de desabafos pontuais e das discussões apressadas nos grupos dos eixos. Tenho dúvidas se a metodologia dessa conferência foi pensada para efetivamente propor o diálogo”, ressaltou Juliana, que participa de coletivos como Escritores Conquistenses, Amantes da Leitura e Bibliotecas em Ação.
Registros do primeiro dia da 5ª Conferência Municipal de Cultura de Vitória da Conquista, em 11 de setembro de 2023. Fotos: Juliana Brito.
Além disso, segundo a historiadora, não houve debates sobre a aplicação dos recursos provenientes das leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, instrumentos importantes para o fomento da classe artística e cultural, que vem reivindicando não apenas verbas para produções locais, mas também a reativação de espaços artísticos.
Para Juliana, com a frustração do que poderia ter sido e não foi a 5ª Conferência de Cultura de Vitória da Conquista, fica ainda mais evidente a urgência da elaboração democrática do Plano Municipal de Cultura e da organização da classe. “[…] É vital a continuação da mobilização do setor cultural, pois do contrário, o poder público jamais ouvirá os anseios da comunidade”, afirmou.
Ausência da prefeita e dos vereadores
A ausência da prefeita Sheila Lemos, bem como de representantes da Câmara de Vereadores, foi outro motivo de crítica por parte dos agentes culturais que compareceram à conferência. A gestora e os membros do Legislativo não estiveram presentes sequer na abertura do evento. Quem representou a administração municipal foi o secretário de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer, Xangai, e o coordenador municipal de Cultura, Alecxandre Magno.
Segundo o escritor Jeremias Macário, que integrou a gestão mais recente do Conselho de Cultura, o não comparecimento de Lemos e dos parlamentares “passa a impressão de que eles têm medo de cultura, ou imaginam que não rende voto, daí não dão a devida importância”, escreveu no seu blog pessoal. “Mais uma vez ficou a indignação dos artistas de que a nossa cultura mal serve de enfeite nas mesas do Legislativo e do Executivo”, acrescentou.
A mesma percepção teve Juliana Brito, que avaliou a ausência como “lamentável e muito significativa”. De acordo com ela, é preciso entender “que há um grito ecoando na classe artística que clama pela compreensão de que cultura não é evento, é toda uma cadeia material e simbólica complexa e permanente que precisa ser fomentada e articulada pelo poder público e a sociedade civil”.
Eleição do conselho e importância da conferência
Para garantir que a sociedade civil continue participando das discussões e da construção de políticas culturais efetivas para o município, durante a conferência, também foi realizada a eleição para a nova gestão do Conselho Municipal de Cultura, no biênio 2023/2025. Além disso, ocorreu ainda a votação que definiu os delegados que irão representar Vitória da Conquista nas conferências territorial e estadual.
Foram escolhidos como membros titulares do Conselho: Gilvandro Oliveira, Alex Alves (Baducha), Lívia Cerqueira, Michkele Xavier e Robson Porto. Já os delegados eleitos para participar da Conferência Territorial de Cultura, que acontecerá em novembro, no município de Feira de Santana, foram: Daniel Leite Almeida, Dayse Maria, Lívia Cerqueira, Juliana Brito, Matheus Amaral e Pacífico Ferraz.
Daniel foi escolhido pela maioria dos votantes e, portanto, já tem participação garantida na etapa estadual. Ele contou que ficou feliz com a diversidade da gestão eleita para o conselho e agora espera que os representantes consigam levar todas as discussões dos eixos que foram apresentados na conferência municipal para serem aprofundadas no próprio órgão. “É muito importante que o conselho seja alicerçado pelos fazedores de cultura”, disse.
Durante a conferência, foi realizada a eleição para a nova gestão do Conselho Municipal de Cultura. Foto: Secom/PMVC.
Outro momento relevante da conferência foi a apresentação de cartas com demandas do setor cultural do município. Uma delas foi entregue pela SASB e a outra por entidades, coletivos e grupos que atuam no campo literário em Vitória da Conquista, a exemplo da Associação Instituto Relicário e do Foro Literário Sertão da Ressaca. “Isso mostra que a gente tem setores da cultura mobilizados e dispostos a construir juntos”, pontuou Daniel.
Para a professora, atriz e produtora Dayse Maria, que integra o coletivo Movimenta Cultura VCA, criado recentemente para unir artistas e agentes culturais do município, apesar dos problemas, a conferência foi importante por cobrar da atual gestão municipal a necessidade de se pensar a cultura de maneira estruturante.
Um dos objetivos do grupo, segundo ela, é manter a classe artística organizada para fazer valer os encaminhamentos do evento e, assim, lutar pela efetivação das políticas culturais em Conquista. “Conquistamos um importante espaço e vamos continuar nessa caminhada nos fortalecendo”, destacou.
Foto de capa: Secom/PMVC.
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Publicado originalmente em 14/09/2023, em Conquista Repórter.
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