[...] Roberto Sant’Ana, um dos mais importantes produtores culturais da história do país, teima em falar o que pensa. E sem papas na língua. E, de novo, seu vocabulário pode assustar. “Viado”, por exemplo, é uma palavra que não sai de sua boca. Seria algum desejo oculto? Ele, que começou no teatro, ou melhor, “no Teatro Vila Velha”, como gosta de enfatizar, é responsável por algumas das melhores descobertas e lançamentos da música brasileira como Elomar, Emílio Santiago, Alcione, Fafá de Belém e Quinteto Violado.
Lançou também a Axé Music, através dos discos “Magia”, de Luiz Caldas, e “Mensageiro da Alegria”, de Gerônimo, e, na contramão, registrou para sempre as vozes de três dos nossos maiores poetas: Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Moraes e Mário Quintana.
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RS – Aí o maestro Carlos Lacerda, do piano, me convidou para jantar em um restaurante que tinha ali na Joana Angélica e lá eu conheci Elomar. Eu digo: “O que é isso?!”. Foi a primeira coisa: “O que é isso?!”. Perguntei a Lacerda como era que se classificava aquilo e Lacerda me disse que não tinha classificação. Bom, eu pensei, isso tem que ser registrado. Aí propus à Polygram, que na hora aceitou. Eu gravei com Mazzola, grande produtor e grande técnico, que veio do Rio para gravar em um estúdio de dois canais, que era o estúdio JS, só tinha esse, ali na Rua Chile. Gravamos o disco e ele levou para editar no Rio, enquanto eu fui providenciar fotos etc. Chamei meu amigo Sílvio Robatto, que era fotógrafo, que chamou o amigo dele que tornou-se meu amigo, Jameson Pedra, também arquiteto e hoje artista plástico. Eu aluguei um Opala, um Opalão, e fomos fotografar Elomar na fazenda dele de bode, no interior de Vitória da Conquista. Fomos para Conquista, para a Barranca do Rio Gavião, fazenda de Elomar. Ele dormia em uma tábua, com uma arma na mão, um fuzil. Eu digo: “Esse cara vai acordar aí assustado e vai atirar na gente” (risos). Os morcegos davam rasantes… Passei duas noites sem dormir. Um calor fantástico e eu só deixava o nariz de fora. Dali a pouco os bodes começaram a berrar e Elomar saiu pela janela, tiros, o caralho, de repente tinha uma onça lá estirada. Ele ia defender os bodes dele, claro. Para tomar banho no rio só meia-noite, porque a água era quente, parecia chuveiro elétrico. É que o rio Gavião corria em leito de pedra, o dia inteiro aquele sol terrível, a água era quente de não dar para tomar banho. Meia-noite ficava morna (risos). E essas coisas me emocionaram muito! Fizemos o encarte com mais de 200 fotos. Dos bodes, que ele tratava como nobres espanhóis, Francisco Orellana…, nomes assim… Bom, fomos fazer o lançamento no Rio, com Quinteto Violado e Grupo Bendegó – eu era produtor dos três. Saiu o lançamento, o Quinteto Violado ficou para fazer uma semana e ficou seis meses. Sucesso! Um show que eu escrevi e dirigi pra eles chamado “Berra Boi”. Depois fomos para o Tuca, em São Paulo. Elomar vai para a esquina da Santa Efigênia com Ipiranga picar fumo de corda. Quando ele acendeu o cigarro de palha a polícia passou: foi preso! Conseguimos, depois de muito explicar, tirar Elomar das mãos da polícia. E eu fui me envolvendo com música.
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Entrevista completa publicada originalmente em 08/04/2017, em Bahia.ba.
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